Criança deve evitar eletrônicos até 12 anos de idade, afirma educador
Tablets são uma péssima maneira que os pais acharam para ocupar as crianças, diz Flávio Comim, 48, ex-economista sênior do Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) e um dos coordenadores do Círculo da Matemática, projeto nascido em Harvard há 20 anos.
Para ele, o ideal é que as crianças evitem os eletrônicos até os 12 anos. "O uso excessivo de aparelhos eletrônicos limita as conexões neurais. As crianças não pensam aberto, mas dentro da caixa."
Leia abaixo a entrevista feita por Thais Bilenky.
O economista Flávio Comim, segundo o qual os pais têm terceirizado para as escolas o papel de educação dos filhos.
Folha - Como pais podem ajudar os filhos na escola?
Flávio Comim - Os pais devem se importar com os estudos dos filhos. As crianças não aprendem com discurso, mas sim com a prática. Você briga com seu filho por causa de uma nota ruim e, quando ele vem mostrar algo que aprendeu, você diz "bonito, agora vamos ver televisão". Os pais têm de ser coerentes.
O efeito família é superior ao efeito escola na explicação do desempenho das crianças. Professores não conseguem mudar a realidade que o aluno vive em casa. Há muito que os pais podem fazer: ler um livro, brincar juntos, criar rotina. Isso dá segurança à criança ir bem na escola. Mas é preciso regras, punições consistentes.
Que tipo de punição?
As maneiras mais modernas de punir estimulam a reflexão das crianças, como na ideia de minutos. Você reconhece que aquilo que a criança fez não está certo e dá um tempo para ela pensar. Mas sempre com afeto. As famílias parecem estar cansadas demais para se preocupar com o mundo dos filhos –os pais terceirizam para a escola a educação dos filhos e esta devolve para os pais. As crianças são educadas em um vácuo que que tem sido preenchido pela tecnologia.
Isso é ruim?
É péssimo. iPad e tablets são a maneira que os pais de classe média encontraram para ver as crianças ocupadas. Um superestímulo virtual pode levar também a problemas de comportamento, como à busca por satisfação imediata em tudo. O uso excessivo de aparelhos eletrônicos limita as conexões neurais. As crianças não pensam aberto, mas dentro da caixa, naqueles parâmetros que são dados. As sociedades médicas na Inglaterra e nos EUA recomendam que, pelo menos até os 12 anos, crianças não usem muitos eletrônicos. Os pais, talvez no intuito de ajudar e maravilhados em ver os filhos operando esses aparelhos, se rendem, indefesos, a todo tipo de tecnologia. Os problemas vêm depois.
Livros e brinquedos nessa fase são mais recomendáveis?
Sim, se receber os estímulos certos, uma criança pode começar a ler aos quatro ou cinco anos. Do contrário, ela pode ter a mobilidade prejudicada ou enfrentar dificuldades para diferenciar cores.
E o aspecto lúdico?
Ninguém tem excelência se não faz algo com um pouco de prazer. O problema é que muitos pais têm um nível educacional limitado. Dizem às suas crianças "matemática é difícil mesmo", dando uma autorização tácita para o seu desinteresse e desengajamento. Esses mesmos pais precisam de apoio.
Talvez o maior desafio na nossa educação hoje seja a humanização das relações entre professores e alunos e entre professores e pais. As escolas precisam criar vivências que aproximem as pessoas, não apenas reuniões para reclamar das crianças.
Como fazer isso?
Cito o projeto Círculo da Matemática, em que se diz que "pequenas ações dão grandes resultados": chamar os alunos pelo nome ou registrar no quadro uma resposta errada ou elogiar não o aluno, mas suas respostas são ações de gestão de sala de aula que promovem a inclusão. O fundamental é ter respeito ao aluno como um ser inteligente. Vários professores perdem esse respeito em condições hostis de sala de aula, o que leva ao embrutecimento das relações.
Fonte: Folha de São Paulo 14/09/2014